quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

O Rio num dia de chuva

 

O Rio num dia de chuva

Chovia. E quando chove no Rio de Janeiro é a previsão do caos. No Centro da cidade, então... nem se fala. Aqui as pessoas não sabem andar de guarda-chuva. E de fato é complicado. Você tem que olhar para o chão – acredite, são muitas as poças d’água – pro carro que vai passar não jogar água suja na sua roupa limpa, e, principalmente, para o guarda-chuva da pessoa ao seu lado não bater no seu. A neurose é tanta que eu chego a ficar encolhida, agarrada à minha bolsa e com os ombros curvados e as mãos cruzadas tamanha é a vontade de seguir meu caminho sem surpresas.

Atravessar a rua faz parte desse capítulo “chuva no Centro do Rio”. Eu sempre traço uma reta e uma estratégia. Assim não piso em falso, mantenho a minha calça jeans limpa e  minha boca longe de palavrões.

Pausa. São segundos esperando o sinal fechar.

Que susto!

Porra, olho pro lado e tem um cara embaixo da minha sombrinha.

“Desculpa, posso pegar uma carona aqui”?

Se falei não lembro. Mas fiz que sim com a cabeça. Ia ser bem rapidinho – duas faixas de rolamento e só. Ok, duas indo e duas vindo. Mas, tudo ligeiro. E, além do mais, era gatinho. 
Não ia me custar nada.

Naqueles segundos, parada estava e parada fiquei. Olhei pro outro lado, parecendo preocupada e com pressa. Não queria de modo algum olhar pra ele de novo.

“Eu já te vi por aqui. Você trabalha aqui perto”?

Envergonhada, acho que pronunciei um sim entre os lábios.

Atravessamos.

E nessa eu vi o olhar dele de relance. Os meus continuam tímidos.

“Obrigado. Espero te reencontrar num dia de sol”. E lá se foi ele em direção ao Largo da Carioca.

Eu, quase que acamada na Avenida Paulista fria e distante, esbocei um sorriso de lado e me perguntei “sério, eu ouvi isso”?

Não demorou nem meia hora para que eu guardasse o kit chuva e tirasse o casaco. Afinal, esse é o Rio de Janeiro.

O sol voltou!

Ora, é outono. Faz frio e calor. Muda tanto o tempo quanto o meu estado de espírito. Só sei que meu caminho de volta pra casa foi outro por alguns dias. No claro intuito de não reencontrar o tal cara despojado e desprevenido.

Aquele cara devia estar por ali só naquele dia, resolvendo coisas. Mas por que ele perguntou se eu trabalhava por ali? Não, é mentira. Ele nunca me viu. É papo de homem. Tava querendo chamar minha atenção. Eu fico só sacando caras assim. Ele espera uma alma carente cair na lábia dele e créu. Coisa de cafajeste. Claro, deve ser o pior tipo de homem. Veja só. Quanta simpatia! Com uma desconhecida? Imagina eu casada com ele sabendo que ele fala com qualquer uma na rua? Nunca que ia confiar.

As semanas se passaram, eu esqueci do infortúnio e voltei à rotina. Mesmo caminho, mesmas ruas, mesmo sinal.

“Opa”!

Meu Deus, susto de  novo! Eu ando tão distraída. Como é que pode?

“Oi. Bom te ver. E dessa vez num dia tão bonito. Tanto quanto você”.

Jesus, que cantada barata. Devolve que esse aí veio com defeito.

“sabia que ia te ver de novo. Mas, sério... achei que tivesse sido demitida, sei lá... há muito que não te vejo por aqui”.

Olha ele, gente, puxando assunto pra ver se cola.

“Então.. não quero ais te encontrar por acaso”.

Pausa.

Até que olhando, assim, melhor, esse jeito malandro trabalhador é interessante. Esse olhar oblíquo que me deixa encabulada pode render mais. Tô bem precisando de uma aventura mesmo. Vidinha morna de amor romântico não mantém a gente em pé, não é? Vamos dar uma chance.

“A gente podia combinar um cineminha”.

Ah não. Brochei. Tem coisa mais casal que filme de sessão da tarde? E eu aqui crente que ia viver um começo de paixão avassaladora, um sexo descompromissado. Ah vá.

“Legal! Te pego na terça então”.


Pano preto. 



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